sexta-feira, 7 de junho de 2013

De quem são os custos e os benefícios dos protestos contra o aumento das tarifas do transporte público

Estou ao lado da janela, de ouvido atento aos sons para saber se a manifestação contra o aumento da passagem do transporte público, no segundo dia consecutivo, passa aqui perto de novo. Quero descer e participar. Deveria de ter já ido, não fosse um pagamento com hora para ser efetuado, no caixa eletrônico. Passei anos esperando por isso, desde que comecei a aprender o que é o mundo.
Desde o ensino fundamental tinha em mente que o povo tem de tomar a rua, para o lazer, para seus direitos e para a mudança, que também cresci desejando. Achava o máximo quando via gente esclarecida protestando por itens como o preço do transporte público nos países europeus, considerados berço da cultura moderna. E hoje acho o mínimo, o mínimo do que deve ser feito por uma população minimamente inteligente.
Mas aí hoje ouvi algumas pessoas reprovando o protesto, criticando o que foi feito porque deixou prejuízos no Metrô e num shopping. Comentaristas de TV também reprovaram com suas feições e tons de voz, além do texto. Realmente é lamentável, também acho que não deveria existir depredação alguma, nem em espaço público nem no privado. Só que, como a maioria dos atos que envolvem civilização, esse cobra um olhar mais macro, menos maniqueísta: histórico – o que fundamentalmente requer calcular os custos e os benefícios dos processos.
Não reclamam todos, direitistas e esquerdistas, de que brasileiro é passivo, tem síndrome de corno, não sabe votar nem mudar nem protestar? Comemorem, porque podemos, com esses de ontem e de hoje, ter um começo. E se não sabemos mesmo protestar, que façamos mais e mais para que possamos aprender.
Ouvi ainda que 20 centavos – a passagem do ônibus, do Metrô e do trem foi de R$ 3 para R$ 3,20- são muito pouco para justificar um protesto. Aí, acho não. Temos, nessas tarifas, um grande motivo de protesto, sim.
Por que
O bilhete já era caro, como muitos outros itens dessa São Paulo impossível de se viver, abusiva, em que apenas os que muito têm ganham dinheiro – o resto apenas trabalha para pagar uma difícil sobrevivência. O resto somos tanto os que moramos mais no centro quanto os da imensa periferia desconhecida dos mesmos que criticam o protesto (e olha que nem a grande maioria dos jornalistas sabe como é o chão tão longínquo de Parelheiros, Brasilândia, São Miguel Paulista e afins).
E, mesmo já sendo caro, esse sistema de transporte, é ineficiente e indigno. E não falo apenas pelo Metrô lotado, pelo trem transbordante e pelas estações claustrofóbicas, de tão superlotadas, que pego diariamente. Isso ainda é sorte, perto do mundo todo que depende exclusivamente da falida e congestionada rede de ônibus que encarcera esse país desconhecido que é São Paulo. Desconhecido por aqueles que têm como se considerar formador de opinião. Por que os pobres desse lugar não formam opinião: eles nem têm tempo para isso.
Pobre, em São Paulo, é muito mal tratado. É desprezado e cuspido na cara. Digo porque, nos meses em que trabalhei no jornal Agora, o único que realmente vai à periferia, percorri os imensos extremos desse mundo caótico chamado de cidade.
Esses mesmos pobres e outros trabalhadores não tão pobres, mas que têm os mesmos direitos a um transporte público digno, passam quatro, cinco ou até seis horas por dia ensardinhados nessas latas herméticas. Tempo com que poderiam investir na saúde, na educação, no lazer, no convívio com os queridos, na felicidade.
É desse transporte infernal e paraplégico de que tratam esses primeiros protestos. De um transporte injusto, que recebe mais de R$ 1 bilhão de subsídios pagos por nós, anualmente, às empresas que deveriam prestá-los com o mínimo de dignidade. O cálculo desse subsídio, que nenhum governo gosta de comentar, é baseado no número de pessoas que rodam as catracas, não na velocidade nem no Km rodado. As empresas recebem esse subsídio, que enrobusteceu ano a ano, nas últimas gestões municipais, para continuarem sem cumprir com a finalidade de transportar. Essa grana toda é queimada sem que tenhamos transporte eficiente.
Custos e benefícios
Todos sabem da velocidade média de tartaruga dos ônibus e da falta de corredores exclusivos para que andem – isso é notícia clichê. Deveria ser de conhecimento e memória geral de todos, também, que os governos historicamente escolham investir no transporte individual o dinheiro de pobres e de ricos que não sonegam, em detrimento da gestão para o coletivo.
Por essas inversões de lógica e de outras que assolam nossos cofres e nossa moral, como população, que temos de ir às ruas, mesmo que os governos tenham custos com reparos de lixeiras e vidros das estações de Metrô. A lógica é que os gestores parem de denegrir e desrespeitar a população e não que esta seja inibida ou proibida de requerer o que já era para ser feito antes, por direito. Os governos devem temer o povo, não o contrário.
Quem está depredando quem? Quem está dando prejuízo a quem? Contem os desmandos dessas gestões caducas, míopes e até maldosas, e calculem o tamanho dos custos e dos benefícios que ficam para a nossa história.
A despeito desses custos, é preciso protestar mais e contra mais desmandos, até que se equilibre o respeito entre governantes e governados. Até que a síndrome de corno exista apenas no nível individual, para azar dos que ficam muito tempo longe dos amados – talvez pelo tráfego.

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